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sábado, 4 de novembro de 2017

Por dentro de uma escola sufi iraquiana


Trazemos agora um texto sobre uma escola naqshbandi do Iraque. Neste link, aqui no blog, há uma performance por devotos canadenses dessa linhagem sufi.

Por dentro de uma escola sufi iraquiana

Honar Hama Rasheed

Um menino magro de 10 anos atravessa o pátio da escola de educação religiosa onde ele estuda há um mês. O garoto, Mirin Mohammed, veio do distrito de Darbandikhan, sudeste da cidade de Sulaymaniyah, na região semi-autônoma do Curdistão iraquiano. Foi matriculado lá porque seu pai quer que seja um clérigo no futuro, mas no momento o garoto está apenas faminto e tenta espiar a cozinha para saber qual será a próxima refeição.

Ele conta que não tem contato com a família desde que está aqui, há uns trinta dias.

Longe de ser cruel, esse procedimento é padrão nessa escola religiosa, situada no distrito de Bayara, nordeste da cidade curda iraquiana de Halabja.

Para serem aceitos na escola, os estudantes devem seguir as regras ao pé da letra e não podem usar aparelhos cotidianos como televisões, celulares ou computadores.

"Quando os alunos chegam, nós confiscamos tudo isso", conta à entrevista o diretor da escola, Fares Mohammed Shaqlawi. "Eles não podem usar esses aparelho enquanto estão aqui exceto em emergências. Nós não queremos que os alunos sejam distraídos por assuntos mundanos".

A khanqah -como essas escolas são conhecidas- em Bayara tem 132 anos de existência. A escola é especializada em uma forma de espiritualismo sunni chamada Naqshbandi; os alunos têm idades de 10 a 35 anos e vêm de todos os lugares do Curdistão iraquiano e também da Turquia, Irã e Síria.

Não há um prazo específico para que os estudos sejam concluídos. Os estudantes trabalham em seu próprio ritmo e se graduam quando terminam. "Após concluírem seus estudos, os alunos ganham certificados e podem se tornar pregadores ou imames", explica Shaqlawi. Geralmente os cursos tomam de 5 a 7 anos. Há duas etapas, e quando o estudante completa a primeira parte ingressa no nível avançado e ajuda a ensinar novos iniciantes.

O diretor conta, contudo, que o governo, sem explicar o porquê, não reconhece o diploma dado pelo curso. A escola acrescentou à grade disciplinas como Inglês e Ciência da Computação, mas o problema continuou. A luta segue para que, no futuro, o curso tenha reconhecimento oficial.

Um dos aspesctos interessantes da visitação à escola é a presença de túmulos e santuários de vários lideres religiosos da comunidade, na mesquita local. Centenas de visitantes vêm para isso.

O diretor Shaqlawi conta que, tradicionalmente, a khanqah tem dois papeis principais: ensino e trabalho assistencial. Os santuários se tornaram uma fonte de recursos graças às doações dos visitantes. Assim é possível garantir abrigo e alimento para os estudantes, assim como para os visitantes; todos comem junto com os alunos.

Outro dirigente da escola, Mullah Yassin, conta que o dinheiro recebido pela escola cobre as despesas com os alunos. Ele reluta em dizer exatamente quanto a escola aufere, e explica que "acreditamos que Deus está abençoando nossos proventos e garantirá que possamos arcar com nossas despesas".

Entre 2001 e 2003 a área esteve sob o controle do grupo sunni extremista Ansar al-Sunna. A escola precisou ser fechada e as relíquias dos santuários levadas para serem mantidas a salvo.

"Ao longo de sua história as portas da khanqah nunca se fecharam, exceto nessa época", diz Shaqlawi. "Foram tempos sombrios".

Acerca da relação da escola com o chamado Exército Naqshbandi, grupo sunni alinhado ao antigo ditador Saddam Hussein, Shaqlawi é taxativo: não têm nenhum vínculo com eles. "Não há nenhuma relação, de nenhum tipo, com eles, e também somos contra o que eles fazem", afirma.


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