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domingo, 3 de novembro de 2024

Ver o que é real com os olhos do coração


"Certo dia as esposas do sheik Abdul Qadir al-Gilani se aproximaram dele e disseram: 'Ó possuidor do melhor dos caracteres, teu pequeno filho está morto, e não vimos uma única lágrima em teus olhos, nem tampouco mostraste nenhum sinal de tristeza ou de pesar. Não tens nem um pouco de compaixão por alguém que é uma parte de ti? Nós mesmas estamos encolhidas de dor, enquanto tu segues adiante com teus assuntos como se nada tivesse ocorrido. Tu eras nosso mestre, nosso guia, nossa esperança neste mundo e no próximo, mas se teu coração é duro e não há misericórdia nele, como poderemos nós, que esperávamos contar contigo no Dia do Juízo, acreditar que tu nos salvarás?'. 

O sheik respondeu: 'Ó minhas queridas amigas, não penseis que meu coração é duro. Eu tenho pena do infiel por sua descrença. Eu tenho pena do cão que morde e rogo a Allah para que deixe de morder, não porque eu me importe de ser mordido, mas porque os outros lhe jogam pedras. Por acaso não sabeis vós que minha compaixão é herdada daquele que Allah enviou como uma misericórdia sobre o universo?'. As mulheres responderam: 'Certamente, se tens pena até do cão que te morde, como não mostras nenhum sentimento por teu próprio filho, que foi golpeado pela espada da morte?'. 

O sheik respondeu: 'Ó minhas tristes companheiras, vós chorais por vos sentirdes separadas do filho que amais. Mas eu estou sempre com quem amo. Vós vistes vosso filho no sonho que é este mundo, e vós o perdestes em outro sonho. Allah disse: 'Este mundo não é senão um sonho'. É um sonho para os que se encontram dormindo. Eu estou desperto. Eu vi o meu filho quando ele estava dentro do círculo do Tempo. Agora, ele caminhou para fora desse círculo. Eu ainda o vejo, e ele está comigo. Ele brinca ao meu redor, exatamente como fazia antes. Porque, quando se vê o que é real com os olhos do coração, esteja vivo ou esteja morto, a verdade não desaparece'". 

(Narrado pelo sheik Tosun Bayrak al-Jerrahi al-Halveti, em introdução ao "Segredo dos Segredos" [Kitab Sirr al-Asrar] de Abdul Qadir al-Gilani [1077-1166]).

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